sábado, 28 de novembro de 2009

Mulher

Na adolescência eras uma rapariga contida. Olhavas-te ao espelho e abominavas a imagem reflectida. Vias um patinho feio, desprovido da esperança de se ver transformado em cisne. Observavas as outras raparigas á tua volta. Todas te pareciam mais belas, mais interessantes, com vivências mais aventurosas. Refugiavas-te na cognição. Era esse o teu trunfo. Era no conhecimento, nas capacidades de análise e de síntese, que te escondias. Era com elas que te defendias, que atacavas o mundo. Ocupavas o teu tempo, a tua consciência com leituras, escritas, exercícios de matemática, conjugações de verbos em línguas estrangeiras...
Os rapazes eram para ti um segredo, um mistério.
Estabelecias, com alguns, contactos visuais, mas não te deixavas ir mais além. O receio da recusa, não te permitia sair do perímetro de segurança que estabeleceras. A rejeição era o teu maior pesadelo. Por isso mantinhas-te à distância, impedias-te de arriscar.
Foste crescendo. Aos poucos, os rapazes, agora homens, começaram a olhar demoradamente para ti, a procurar a tua presença. Estranhavas. Não acreditavas. Pensavas que "esses" deveriam ter algum defeito grave. Mas eles não desistiam. E aos poucos, começaste a acreditar que te olhavam porque abanavas algo no seu mundo.
E então começaste a mudar. Há já algum tempo que a contenção não é a tua principal característica. Esquecida das inseguranças da adolescência, tornaste-te numa rapariga expansiva, capaz de exprimir desejos de uma forma assertiva. Andas na rua com as costas direitas, com o queixo levantado. O som dos teus saltos ecoa pelos locais onde circulas. És bonita, tens um corpo apetecível. Fazes virar cabeças quando passas. Vestes-te bem, de acordo com a moda. Conversas à vontade sobre qualquer tema. Mesmo quando não dominas o tópico da conversa, tens sempre uma tirada inteligente. Na maior parte das vezes, ninguém consegue perceber a tua ignorância. Tens sucesso. Um bom salário. Tudo em ti denota confiança, capacidade para vencer. Poderias ser alvo de uma reportagem numa dessas revistas para mulheres, como modelo de auto-estima promovida.
Um destes dias encontramo-nos. Tomamos um café num desses sítios onde só vai gente bonita.
Pareceste-me algo triste. Perguntei-te qual o motivo.
Confessaste-me, à mesa do café, que não tens tido "sorte" com os homens. Que és abordada com frequência. Alguns dos sujeitos até se revelam interessantes, aos teus olhos. Mas, no final do primeiro encontro, percebes que não irão voltar a ver-se. Por vezes, cruzas-te com algum, mais tarde. Invariavelmente está acompanhado por uma rapariga desinteressante e amorfa.
E perguntaste-me.
- O que tenho eu de mal?
E eu respondi-te.
- Olhas os homens de igual para igual. Podes competir com eles. Podes até vence-los. E isso é  algo que eles não conseguem ultrapassar, que temem mais que tudo. Metes-lhes medo.
E tu olhaste o horizonte. Sorriste. E secretamente amaldiçoaste todas as incendiárias de soutiens.

5 comentários:

  1. Só tem dado com gaijitos inseguros.
    Os Homens, com H, gostam de quem lhes dê guita aos neurónios. E sentem-se verdadeiramente atraídos por mulheres inteligentes, ainda por cima, que tenham a auto-estima em alta, ou que aparentem isso. Digo eu...

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  2. Lúcia,
    Tens alguns guardados na cave? A amiga a gradece.
    ;-)

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  3. Na cave? Era bom demais... pera eles ;))

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