terça-feira, 31 de maio de 2011

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Cenários improváveis

Conduziu devagar, contrariamente ao que é seu hábito. Aliviou o acelerador porque necessitava de tempo para pensar. Desde que saíra de casa, os pensamentos redemoinhavam-lhe na mente. As perguntas sucediam-se e os cenários possíveis enrodilhavam-se uns nos outros, como uma meada de linha. Não conseguia tomar uma decisão.

Paro? Não paro? E se parar, o que digo? Se não parar, o que acontece?

Enquanto se aproximava do local, começou a sentir os sintomas que já conhecia de cor. As palmas das mãos suadas, a boca seca, as pernas a tremer, um calor insuportável na face, o coração a bater acelerado... Estava composto o cenário para que rebentasse a catástrofe iminente. Entretanto, quase em piloto automático, pois não deu conta como ou por que caminhos, tinha chegado ao local. Parou o carro e tentou recompor-se. Pegou no telefone. Hesitou. Acedeu à lista telefónica e percorreu-a com a ponta do dedo. Lá estava o número, mesmo no final. Com o dedo, carregou duas vezes no ecrã e esperou. Do outro lado, a voz habitual respondeu-lhe afirmativamente. Saiu do carro e percorreu os dois metros necessários. Aproximou-se e cumprimentou-o mostrando a vivacidade habitual. Trocaram as parcas palavras a que tinham direito. Antes de se despedirem, ela tocou-lhe ao de leve na mão com a ponta dos dedos. Tinha necessidade de o sentir, para saber que ele ainda ali estava ao seu alcance, que ainda era real. Voltou ao carro e arrancou sem olhar para trás. Na boca carregou as palavras que tinha ensaiado e que o receio a impediu de proferir: que apesar de ter um motivo válido para ali estar, o que efectivamente a tinha movido até lá era o ímpeto de o ver; que também ela se arrepende; que o mundo ficou mais escuro e que ela não sabe como iluminá-lo; que nestes dias é capaz de se quebrar apenas com um sopro do vento, de tão fragil que está; que apenas os braços dele em seu redor poderiam curar a tristeza.
Noutros tempos teria sido o orgulho a calá-la. Nos dias de hoje é apenas o medo.

sábado, 28 de maio de 2011

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Constatação #9

Crescer é aprender a lavar a tristeza com lágrimas, e depois enxaguar os olhos para ver que há sempre alguém que é capaz de se esforçar para nos fazer rir.

Obrigada!

Um peso...

O pobre do puto limpou a parede e ainda assim foi parar à cadeia. Os outros senhores não limpam o que sujaram e está tudo bem. E no final das contas, bem analisada a questão, estavam ambos em campanha eleitoral. Ou será que um amor jovem é menos importante que o destino de um país moribundo?

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Fim de tarde de mel e limão

Quando chegou a casa carregava o cansaço de mais um dia igual a todos os outros. Cirandou pelas divisões sem rumo ou intenção, até que se decidiu a ancorar num dos sofás da sala. Escolheu o amarelo, aquele que fica virado para a televisão. Sentou-se encostada às almofadas, abriu o livro que a tem acompanhado e começou a ler. Após poucas linhas, começou a sentir os olhos pesados e um torpor nos músculos do corpo. Pousou o livro sobre o colo e deixou-se arrastar pela preguiça que a conduziu para um estado de semi-consciência.  Não adormeceu. Não ficou acordada. Percebia o que se passava em seu redor, ouvia os miados do gato, sentia o vento vindo da janela a arrefecer-lhe a pele, mas não conseguia mexer-se. Ficou algures num limbo entre o sono e a vigília, sentindo-se como que a pairar sobre si própria. Aos poucos foram-se-lhe formando imagens sob as pálpebras cerradas. Duas pessoas sentadas no sofá. Uma conversa em voz muito baixa. Os seus olhos fechados.  O calor da respiração de uma boca que se aproxima da sua. A pressão leve de um par de lábios contra os seus. Um arrepio. Uma boca cujos lábios se entrelaçam nos seus, na perfeição desde a primeira tentativa, duas línguas que dançam, sem erros, uma coreografia complexa. O gosto doce de um beijo roubado...Um telefone que toca. Um telefone que toca e que a faz acordar. Um telefone que a acorda, para lhe propor a compra de umas férias de sonho. Um telefone que a acorda, e ao qual ela responde que apenas quer que a deixem continuar a sonhar.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Estado de espírito

A tristeza tem o sabor da água com gás, a esperança vem com a forma de uma chave, o empowerment brilha numa lâmpada fluorescente, a paixão adquiriu o cheiro libertado por um cigarro acabado de fumar, o sono embala os pensamentos, os neurónios receptores olfativos agravam a ilusão, a memória prolonga a insónia, daqui a nada começa um novo dia.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

domingo, 22 de maio de 2011

Avisos que chegam tarde demais

"A situação estranha de bater à porta, beijá-la na cara, sentar-se na sala e esperar que ela acabasse de se arranjar, vê-la sair do quarto, também perfumada, fazendo tilintar as suas pulsieras, e ouvi-la perguntar, como se outras vezes lho tivesse perguntado, se tinha visto onde deixara a bendita chave,estava sempre a perde-la, e ajudá-la a procurar a bendita chave para descobrir que a tinha deixado na fechadura, e sorrirem ambos, como se tudo fosse agradável, provocou-lhe a inquietante e desorientadora sensação de se encontrar no início de alguma coisa, embora soubesse muito bem que não estava em condições de começar nada. Aquele salto mortal podia provocar-lhe doses elevadas de sofrimento."

O romance da minha vida. Leonardo Padura. pp. 123

sexta-feira, 20 de maio de 2011

"o frio parece-me esclarecedor, viva o sol"

A minha vida é uma catadupa de dúvidas. A ministra da educação está na televisão. Apetece-me cheirar-te. O inverno tem sido muito seco. Viro à direita? O Egipto está a arder. Ou será o Egito? Acabaste de chegar e já estás a fazer estragos. Doi-me a garganta. Os publicitários da L'Oreal são muito inteligentes. Espero por ti, ou vou dormir? Hoje lembrei-me de tomar os remédios. A Fátima tem um repolho azul ao peito. Ela contava aventuras, a vida dela é agora uma aventura. Comemos massa ou batatas? Vou ter saudades tuas. O Renato diz que é inocente, o Silvino também. O romboide contraiu-se. Não quero que me ligues às 3 da manhã. O Futebol Clube do Porto vai ganhar ao Benfica,  e eu vou ver o Cisne Negro. Eminem - Lose Yourself. Mudei de canal. Gosto da publicidade do AXE. O inverno tem sido muito chuvoso. Não há certezas. Tenho um saco de agua quente na cama. Ontem? Hoje? Amanhã?

(Letras que foram deixadas em rascunho. Só porque o teu era bem melhor que o meu.)

segunda-feira, 16 de maio de 2011

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Cá se fazem...

Ela é uma menina mimada, habituada a que lhe façam todas as vontades, até as mais exóticas ou extravagantes. Não gosta que a contrariem. E quando o fazem, arquitecta planos de vingança, pautados pelos mais finos requintes de malvadez.
Ora, um dia destes, decidiram despojá-la de um dos seus bens mais preciosos. Roubaram-lhe o sorriso que a recebia todas as manhas e que lhe aliviava a pena dos dias sempre iguais e, no seu lugar, colocaram uma espécie de autómato que tem apenas 3 funções que usa aleatoriamente em resposta a todo e qualquer estímulo.
A cabeça dela começou de imediato a arquitectar um plano para reagir. Rapidamente reprogramou o robô/substituto para que este começasse a responder às suas necessidades básicas. Em simultâneo, e sem avisar ninguém, contratou o sorriso, mudando-lhe o horário para a noite. E assim repôs a caótica ordem que reinava na sua vida.
Depois de tudo tratado, sentou-se no primeiro balcão, e começou a assistir com um sorriso irónico ao desespero de quem a resolveu contrariar, os mesmos que intimamente se arrependem pela troca, e desejam que volte tudo ao início.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Concorrência desleal

Com tanta perna nua à mistura, um Jason Donovan e pelo menos dois Take That, não tens hipótese.
Já foste.

sábado, 7 de maio de 2011

Começo a necessitar de ajuda para viver em sociedade

Alguém me consegue explicar porque é que uma criança de 5 anos necessita de se pintar com base, sombra, rimel e lápis para os olhos, para um espectáculo de ballet, no qual vai ter um intervenção de 10 minutos. Expliquem-me e convençam-me por favor, com argumentos válidos, porque eu ainda não consegui compreender e acima de tudo não consigo aceitar.

Morte aos fantasmas

Confesso esta minha inabilidade. Não consigo sequer desejar a morte a alguém, quanto mais pensar sequer em matar. E por isso, vou deixando viver os fantasmas que eles carregam nas mochilas, quando me chegam à porta de casa.
Vou tentando desactivar a capacidade dos espectros, de assombrar dias e noites, fazendo-os adormecer, mas sou incapaz de os aniquilar, mesmo sabendo que o mais certo é voltarem a acordar e a fazer diabruras.
Na impossibilidade de contratar  os senhores do filme, resta-me resignar e acrescentar mais um item no já longo formulário de candidaturas.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

"Desabotoa-me o peito"

Desabotoa-me o peito!
Desabotoa-o! Sim!
Eu sou um daqueles modelos antigos,
do tempo em que o corpo era feito à mão, imperfeito,
do tempo anterior ao velcro e ao fecho eclair,
do tempo em que o tempo vinha ora em demasia, ora rarefeito.

Desabotoa-me o peito!
Desabotoa-o! Sim!
Com a ânsia de um jovem enamorado
que pela primeira vez despe a mulher que ama,
e que trémulo dos pés à cabeça,
sente as entranhas e a ponta dos dedos em chama.

Desabotoa-me o peito!
Desabotoa-o! Sim!
Com a subtileza com que a gueixa,
minuciosamente cumpre o ritual do chá.
Com a paciência com que o velho
acorda para o novo dia, pela manhã.

Desabotoa-me o peito.
Desabotoa-o! Sim!
Espreita -lhe para o interior, e com as mãos,
sente as batidas do músculo em convulsão,
aparta-o da matéria viscosa que o envolve e retira-o,
para depois o abrigares junto ao teu coração.


quinta-feira, 5 de maio de 2011

181 dias...

...de sol , de flores a desabrochar, de andorinhas a chilrear enquanto constroem os ninhos.
...de uma Primavera repleta de arco-íris, que nem o Inverno rigoroso conseguiu enegrecer.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Até compreendo, mas não posso concordar...

...porque a vida humana é demasiado importante, para que a morte possa ser festejada.