Monumentos a eventos que nunca se deram:
Às guerras sangrentas nunca travadas.
Às grandes tiradas engolidas ao soar
a voz da prisão. À consagrada união
do corpo nu com o pinheiro anão
que deu o São Sebastião.
Aos aviadores que subiram às nuvens
num piano alado. Ao inventor do motor
que usa como carburante
o lixo das recordações. À esposa do navegante
ensimesmado sobre um solitário ovo em omoleta.
Às Constituições desnudadas. Às independências
de opulento seio. Aos cometas
que à Terra passaram tangentes
(perseguindo um infinito, cujos sinais
são em parte os das nossas paisagens).
Ao coito interrompido, nas barbas do preso,
entre a ideia de autoridade
e a vegetação. Ao achamento
da Infártica, bairro ignoto
do outro mundo. Ao cubista doidivanas
que captava nos telhados o soprano
do telégrafo. Ao suicídio do Tirano
por amor não correspondido.
Ao terramoto – sublinha um contemporâneo –
com deleite pelo povo recebido.
À mão que nunca pegou em dinheiro,
para não falar em membro viril.
Ao total de folhas verdes com direito
inato a desprezar a sua diversidade.
À felicidade. Aos sonhos que impuseram à realidade,
à custa das pessoas, a sua própria arbitrariedade.
1988
Пейзаж с наводнением. Иосиф Бродский
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