quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Causa de morte


Viu a coisa complicada, quando uma chuva fora de tempo transformou o carro que seguia à sua frente numa bailarina de piruetas, e obrigou o condutor a imobiliza-lo mesmo no meio da faixa de rodagem. Tinha guardado a distância de segurança e, apesar do seu carro ter feito um belo número de patinagem, conseguiu evitar danos quer em si própria, quer na viatura, quer em qualquer outro elemento da paisagem que a rodeava.
Seguiu o seu caminho tentando refrear a adrenalina que lhe corria no sangue e atentando a cada pormenor que a rodeava. Não lhe apetecia ter que repetir a proeza. Acabou por chegar ao destino sem mais contratempos.
Não tinham passado ainda 3 horas do sucedido, eis quando, após alguns minutos de conversa com o seu interlocutor (se é que se pode chamar conversa, uma vez que nenhum dos dois possuía conhecimentos num mesmo idioma e ambos tentavam comunicar através de uma espécie de linguagem gestual trapalhona) este lhe entrega um papel com um diagnóstico médico. O documento proibia-o de sair de casa e partilhar com o resto do mundo os bacilos que habitam no seu corpo, que lá se multiplicam, que desenvolvem uma série de actividades lúdicas nos seus órgãos vitais, e que alegremente se transportariam para qualquer outro ser humano que se encontrasse na vizinhança. Quiseram, de imediato, leva-la ao hospital e sujeita-la aos mais diversos exames. Recusou e continua a recusar.
No final da noite, depois de um dia inteiro a pensar que estava a viver no fio da navalha, concluiu que o único perigo que a espreita a cada esquina e que ditará a sua sentença final, tem um aspecto doce e apenas a consegue fazer sorrir.
Agora sabe que apenas poderá morrer de uma forma, e que será este o relatório da sua autópsia:
Corpo sem lesões aparentes, com excepção de uma pequena incisão no tórax do lado esquerdo, entre a 3º e a 4ª costela, que indicia ter sido efectuada por um objecto em forma de seta.
A análise dos fluidos corporais revela elevadas quantidades das seguintes substâncias: Norepinefrina, Dopamina, Seratonina, Oxitocina e Vasopressina.
Causa de morte: Envenenamento agudo.

Sem comentários:

Enviar um comentário