Armada em fada do lar aparentada de Maria de Lurdes Modesto, no domingo, resolvi dar rumo aos restos de frutos secos e cristalizados sobrantes das festas, e confecionar uma espécie de bolo-rei. Escrevo espécie, porque ao que parece, a massa do bolo-rei deve ser feita com fermento de padeiro e deixada a repousar por uma série de horas. Na falta do fermento de padeiro usou-se o famoso e antiquíssimo Royal e o descanso da massa terá sido de uma hora, no máximo, que eu cá não tenho paciência para grandes esperas. Dizia também a receita, retirada da internet pois claro, que a iguaria natalícia deveria ser condimentada com duas colheres de sopa de aguardente velha e outras duas de vinho do Porto. Olhando para a quantidade de massa (e pensando no meio quilo de farinha acabado de despejar), quatro colheres de liquido pareceu-me muito pouco e portanto tratei de dobrar a dose e acrescentar mais um bocadinho, crente de que a humidade na confeitaria nunca caiu mal. Acabado de sair do forno e quebrando mais um dos preceitos, tratei de imediato de cortar uma fatia. Era o meu primeiro bolo-rei, e a impaciência não me permitia aguardar nem mais um segundo. Fiquei alcoolizada só com o cheiro. Tinha exagerado na humidade, estava visto. Só faltava saber se estaria minimamente comestível. Estaria? Estava. Minimamente diria eu. Consideravelmente disseram os meus quatro homens, que se foram guerreando para distribuir entre si as dez fatias que levei comigo hoje de manhã. Não fugindo ao seu habitual registo, fartaram-se de tecer elogios sarcásticos acerca do grau de embriaguez em que iria desembocar a experiência, mas isso não os impediu de discutirem até ao fim quem ficaria com a nona fatia, visto que eu não abdiquei da décima.
Acabam o lanche repetindo que casariam comigo, bastava para isso que eu me limitasse a cozinhar. Faço cara feia e respondo-lhes que sou quase a carochinha. Cozo, varro e passo a ferro, mas ninguém me apanha nisso de casar.
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