terça-feira, 2 de novembro de 2010

Transparências

Esticou a mão para lhe pedir o objecto. Ele sabia qual era o propósito do seu gesto. É um gesto que repete já maquinalmente. É um gesto a que ele responde automaticamente. Desta vez, porque conversava com outra pessoa, estendeu-lhe a mão sem sequer olhar para ele. Ele, em vez de lhe estender o objecto, como era suposto, agarrou-lhe a mão e ficou a segurá-la até ela lha pedir de volta. Ela disfarçou mal a perturbação que o acto lhe infligiu. Corou, gaguejou, ficou assarapantada, disse-lhe que tinha a mãos geladas. Rapidamente recolheu o objecto que ele lhe entregou e fugiu dali. Não sem antes pensar que ele se tinha atrevido a tocar-lhe pela primeira vez. Não sem antes pensar que tudo o que ele lhe tinha dito que poderia vir a ser, já era. Não sem antes pensar que afinal, mesmo apesar de ele negar com todas as suas forças, ele está mesmo cada vez mais transparente.

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